terça-feira, dezembro 30, 2003

A você, amado e prestigiado leitor desse blog, só posso desejar que 2004 seja uma época muito feliz de sua vida, recheada de fodas. Fodonas. Fodescas. Fodinhas. Fodas, fodas e mais fodas. Se você for uma leitora, desejo além disso que as fodas sejam multiplamente orgásmicas. Todas elas.

O restante, meus amores, será apenas a vida que segue rumo a 2005.

Entonces, abracetas nos manés e besos calientes nas minas. Foi um prazer praticamente sexual interagir com vocês.

domingo, dezembro 28, 2003

Feliz 2004, pessoal.

quarta-feira, dezembro 24, 2003

Feliz Natal a todos. Estive ausente neste fim de ano, mas voltarei em 2004 com toda a força.

Feliz Natal, God. Sem você isso aqui não teria a menor graça.

Feliz Natal, Renata. Eu te amo, mané.

sexta-feira, dezembro 19, 2003

Jorge observava a fumaça do cigarro esvair-se de sua boca e adentrar na atmosfera. Era relaxante e tão bom quanto o próprio ato de fumar observar as transfigurações da fumaça que lhe saía dos pulmões após um dia inteiro de trabalho. Nas primeiras vezes que se dera ao raro prazer sentiu sua pressão sangüínea baixar e um torpor parecido com um choque elétrico, ficava meio grogue e aceso. Agora imaginava no ar a fumaça entorpecendo seus alvéolos e penetrando em suas artérias. Aproveitava que Mariana ainda levaria mais uma hora para chegar do escritório e ficava anoitecendo na janela junto com a rua e aproveitando a cor do baseado, com Mariana não haveria muitos silêncios, ela gostava de ver televisão e de conversar bastante.

Gostaria de ter alma de escritor, Jorge pensava junto com seus alvéolos. Transformaria essa fumaça em letras e emocionaria algumas das pessoas que andavam na rua abaixo, quem sabe até a Mariana veria menos televisão e leria suas coisas em silêncio. Certamente seria menos idiota e teria mais trocados na carteira para melhores baseados. A idéia de escrever o enchia de vida naquela janela, havia mesmo deixado para a camada de Ozônio o balé que a fumaça deslizava à sua frente, tragava o cigarrilho e sentia vontade de escrever.

Não havia de ser complicado por demais contar histórias, todo mundo as têm aos montes prontinhas para ganharem vida, narração e personagens. Com as palavras corretas e bem grafadas, suas histórias poderiam ganhar o mundo e de certa forma, ele ganharia o mundo. O mundo, ele pensava em voz baixa, posso ganhar o mundo apenas escrevendo. Tragou e fechou os olhos, precisava de palavras naquele instante, das palavras poderia construir as imagens e mesmo a onda que o cigarro lhe marejava. Poderia começar por aquela cena mesmo, um homem aguardando a sua mulher retornar a seus braços para o amor e suas pequenas misérias, beijos e confissões e silêncios que se morfariam em metáforas e verbos e aliterações. Mariana seria Margarida pois era assim que a amava, como um homem poderia amar uma flor que brilhava solene em meio à lama do cotidiano.

O trinco da porta anunciou Mariana e a música televisiva que preencheu a sala a confirmou. Jogou fora o baseado, já o havia terminado de qualquer modo. Beijou sua pequena margarida na nuca e começou a escrever seu primeiro capítulo. Um homem cuidando para que o mundo não esmagasse aquele ser que o enchia de vida.

terça-feira, dezembro 09, 2003

Os olhos acompanhavam o sorteio da loteria na tevê. Ele poderia ganhar vinte e cinco milhões. Era muita grana mesmo pra ele, sem quase nada a perder. Havia faturado os três primeiros números da seqüência e mal podia respirar. Ficaria rico e seria um homem feliz, porque rico. Ariane se casaria com ele rico, homem e feliz. Só precisava fazer o que já havia conseguido, acertar três números. A modelete sorriu e segurou a bolinha que saiu do globo. 32. Putaquipariu. Só mais duas dentro, rumbora, vamolá. 34 e um inacreditável 35. Sentou-se, os olhos murchos, Ariane longe. Estava vinte e cinco milhões de vezes menos homem, menos feliz e menos rico por culpa de duas bolinhas. Ariane em vinte e cinco milhões de braços distantes, ele só. A modelete repetia as dezenas como se desejasse oferecer a cada telespectador seu o melhor sexo oral do planeta e os dois homens de terno que a cercavam, um obeso apresentador de programas de auditório e um fiscal da Caixa confirmavam que o prêmio continuava acumulado, Adalberto não precisava fazer aquela cara de tacho: ganhara algum na quadra e ainda poderia faturar a mão de Ariane no próximo sorteio.

Olhou o relógio na parede e o dia que nublava. Ainda cedo o suficiente para sentar-se na cozinha, ligar o radinho de pilha e esperar Tomás dar as caras para levar o merecido esporro. Bem, não estava tão irritadiço quanto aparentava, os trocados da quadra lhe garantiriam algumas cervejas geladas num futuro próximo. Tomás era um bom parceiro de copo e o sabia escutar. Era seu melhor amigo desde sempre, desde que resolvera ter um melhor amigo Tomás estava sempre presente. Tabelava com ele no futebol e dividia cúmplice estratagemas banguelas e capengas de dominação mundial e até algumas doenças venéreas. Para leigos, eram irmãos pois de tanta conivência acabaram arranjando até semelhanças físicas e trejeitos em comum. Havia na vila onde moravam a estória conhecida de Rebecca - sim, com duplo “c”, um para cada glúteo - mulata que era famosa por três motivos: a nádega esquerda, a nádega direita e a vez que se enfurnara com Tomás dentro da cozinha de sua casa durante um aniversário da mãe da mulata acreditando piamente que Tomás fosse Adalberto, o seu namorado. Quase irmãos, Adalberto assumia o papel do mais velho porque nascera uma semana antes do primogênito e gozava de certos privilégios como decidir qual das duas garotas no baile seria a dele, ter seu copo cheio antes e o melhor deles, o direito de espinafrar Tomás sempre que ele dava algum vacilo na jogada.

Ariane não era mulata mas tinha os seios que sua mãe desejaria na nora que pediu a Deus. Tinha o sorriso sacana, os cabelos ruivos e todos os sentidos de Adalberto desde a puberdade em comum de ambos. O malandro já perdera a conta das perdizes em que dera cabo fantasiando com a sua pequena diabinha. Mesmo Rebecca, que já estava com ele havia um ano, já entrara nesta repartição pública. O problema de Adalberto era que Ariane não tinha a menor intenção de se misturar com seus vizinhos porque, como qualquer gostosa que se preze, tinha plena noção de seu reinado sobre a testosterona local. Queria ficar rica e venderia seu corpo a um bom preço se fosse o caso, e esse era o caso dela. Saíra da vila para o mundo virgem. Virgem, não santa. Sua virgindade fora leiloada entre executivos, diretores de tevê, atores famosos, publicitários premiados em Cannes, desportistas bem patrocinados e até uma apresentadora de telejornal que desembolsou (da conta do esposo) meio milhão de dólares para adentrar na biografia de Ariane, que nunca havia andado de barco, cheirado cocaína e praticado o cunnilingus. Adalberto nunca saberia disso e amava a pequena infame do mesmo modo, talvez até mais pelo iminente sentimento de perda que ela ostentava. Ariane havia ganho um concurso de modelos no início do verão e teria um papel menor na novela das seis graças a seu sucesso entre diretores e atores televisivos. Aparecia nas colunas sociais em vinte e cinco milhões de braços diferentes, então Adalberto decidira arrumar vinte e cinco milhões para mostrar o que era um homem de verdade à Ariane.

Foi Tomás quem o advertiu que a sua Rebecca estava indo pelo mesmo caminho. Ela tá dando prum gringo, mané, se liga. Seria sua grande chance, a Rebecca. Na mesma noite, no mesmo bar, na garrafa seguinte ele expôs seu plano definitivo ao comparsa. Seguinte, Tomás, a gente dá um pau no gringo quando ele aparecer na vila e arrocha uma grana dele, a gente diz que a Rebecca trabalha pra gente e se ele quiser continuar no gingado da negra vai ter que gingar pra gente antes. Foi Tomás quem lembrou que o gringo era coroa e devia ter família. Adalberto tomou um gole e mandou Tomás continuar falando. Se a gente complicar a Rebecca, o cara vai sumir do mapa, sem contar que a Rebecca vai se emputecer contigo. Sei, sei, continua. A gente seqüestra o gringo, pede uma grana preta e se manda daqui. Adalberto já podia sentir o calor de uma Ariane adormecida em seus braços. Estava mesmo feliz por Rebecca ter arrumado aquele gringo montado na grana. Pediu mais uma dose, encheu o copo do caçula primeiro, tu é um gênio, irmãozinho, tu é foda!

Armaram uma emboscada na saída de um motel grã-fino. O gringo, um argentino, tinha a cachorrada de deixar Rebecca (a provável melhor trepada de sua vida) num ponto de ônibus duas esquinas após o motel e dali rumar para sabe-se lá onde. Nem para dar uma caroninha o sujeito se dignava após todas as posições censuradas no Kama Sutra. Adalberto descobrira pelos jornais que ele era amigo de um deputado federal e dono de uma danceteria famosa entre os bacanas. Se bobear o desgraçado havia feito alguma besteira com a minha Ariane. Seu sangue fervia só de ver a camisa da seleção portenha que Tomás usava no futebol. O gringo, obviamente, era bem casado com uma filha de alguém mais importante que ele, e de repente, mais gringo que ele também. Tocaiaram o sujeito assim que ele contornou a primeira esquina longe das vistas de Rebecca. Era madrugada, ninguém por perto, o sangue de Adalberto furioso. ¡Maricón! !Hijo de puta! Chute na cara, pontapé no estômago. ¡Cabrón! ¡Boludo! ¡Covardes, la policia ... chute na cara. La policia nada, rapá. Enfiaram o gringo desorientado no carro deles e Adalberto partiu de volta para a vila feliz por ter ofendido o hermano na lengua natal dele. O carro do argentino fora abandonado num matagal longe dali por Tomás, que ateou fogo na charanga para garantir. Não pediram os vinte e cinco milhões, mas exigiram da família do gringo um seguro milhão de reais e nada de polícia na conversa. Todo dia na hora do almoço Adalberto levava junto com um prato de sopa uma bolacha para o gringo, trancado num quarto improvisado nos fundos de sua casa. Uma semana se passara e a família amedrontada mandara avisar que ele estava em viagem de negócios.

Adalberto sentado na cozinha esperava Tomás voltar com a resposta do resgate. Parecia que tudo daria certo. Dali a uns dois dias resolveriam tudo, Tomás só não precisava demorar tanto num telefonema. Começou a tocar uma música do Lulu Santos no radinho. Ariane tinha todos os discos do Lulu, imaginava a ruiva saindo do mar como uma onda com seus seios oprimidos no biquíni. Ela deitaria na toalha estendida a seus pés e pediria que ele espalhasse o bronzeador. Adalberto aumentou o som e sorriu. Bastava acertar seis números para aquilo tudo acabar bem, e ele já havia faturado quatro. O dia continuava nublado lá fora.

sexta-feira, dezembro 05, 2003

Não foi desta feita, uma pena. Dá-lhe, Paulinho!

Indiano ganha de Paulo Coelho prêmio de pior sexo na literatura

LONDRES (Reuters) - Um jornalista investigativo indiano ganhou na quarta-feira o pouco cobiçado prêmio britânico de Sexo Ruim na Literatura de Ficção por um relato turbocarregado de um encontro amoroso que compara os enlaces do casal a uma Bugatti.

Aniruddha Bahal, que em 2001 se fez passar por negociante de armas para expor um escândalo de propinas no setor militar da Índia, voou para Londres para receber o prêmio das mãos do cantor Sting, diante de um público de 500 pessoas.

O prêmio de valor duvidoso, que vem sendo entregue há 11 anos, é concedido pela revista Literary Review à descrição mais inepta de uma relação sexual num romance.

Graças a um trecho de seu romance "Bunker 13", Bahal derrotou indicados que incluíam John Updike, Paul Theroux e Paulo Coelho.

O herói do livro diz que se sente como "um senhor de guerra ariano da antiguidade" ao descobrir uma suástica depilada numa parte íntima do corpo de sua companheira.

À medida que a temperatura entre eles vai subindo, Bahal muda de marcha e ingressa no reino das metáforas automobilísticas.

"Ela vai pegando o ímpeto de uma Bugatti. Você a quer mais no trote constante de um Volkswagen. Você arranca a quilometragem máxima de seu galão de gasolina. Mas ela está devorando a estrada, com todos os cilindros em potência total."

O prêmio já foi ganho no passado por AA Gill, Sebastian Faulks e Melvyn Bragg, entre outros.

quarta-feira, dezembro 03, 2003

Vamos torcer, pessoal.

Paulo Coelho concorre a prêmio britânico de Sexo Ruim na Ficção

LONDRES (Reuters) - Nenhum constrangimento será poupado aos ouvintes na quarta-feira, quando o roqueiro Sting fizer a entrega de um dos prêmios literários menos desejados da Grã-Bretanha -- o Bad Sex in Fiction Award (prêmio de sexo ruim na literatura de ficção).

O prêmio de valor duvidoso, que vem sendo entregue há 11 anos, é concedido pela revista Literary Review ao autor da descrição mais tola de uma relação sexual num romance.

Os autores indicados ao prêmio deste ano incluem John Updike, Paul Theroux, Paulo Coelho e Alan Parker.

Entre os trechos apoteóticos que constam na competição figura um do livro "Too Beautiful for You", do ex-executivo da rádio BBC Rod Liddle:

"Ela gozou com os excitantes uivos e gemidos ofegantes de uma tropa de macacos resos -- uma coisa lisonjeira, mas alarmante."

Temas ligados ao automobilismo estão em alta entre os escritores escolhidos.

Em "Peyton Amberg", de Tama Janowitz, o amante explora as partes íntimas de sua namorada "como se estivesse procurando as chaves do carro perdidas". Em "Bunker 13", de Aniruddha Bahal, uma namorada "vai pegando o ímpeto de uma Bugatti".

Metáforas musicais também apareceram. A narradora de "Onze Minutos", de Paulo Coelho, alcança o céu -- "eu era a terra, as montanhas, os tigres, os rios que desaguavam nos lagos, o lago que virava o mar."

Sting, que certa vez se gabou publicamente de que a ioga melhorou sua resistência sexual, vai fazer a entrega do prêmio na noite de quarta-feira, depois que cada um dos trechos que competem pelo prêmio ter sido lido para o público de 500 pessoas.

Entre os ganhadores anteriores do prêmio figuram AA Gill, Sebastian Faulks e Melvyn Bragg.

Ele não poderia dizer que seus pés flutuavam entre os reles mortais por quem gingava por conta da bebida, da luz ambiente ou se teria sido aquele beijo. Um beijo, duas línguas, quatro lábios, mais de cinqüenta dentes e quase trezentos batimentos cardíacos por minuto; um beijo é capaz de nos tirar do chão, que queime minha língua a ferro em brasa aquele que discordar.

Um beijo anônomo e sem rosto, como se o beijo fosse alguém que estivesse ali presente, deixando o tempo passar para abduzí-lo outra vez quando ele já estivesse com os pés mais firmes no chão. Em seus ouvidos a música eletrônica soava como a melhor traviata de Beethoven, mesmo que nem ele e nem eu jamais pudéssemos lhe explicar o que seria uma traviata e muito menos se o pobre Beethoven chegou a compor alguma em vida. Ele só sabia que o compositor havia ficado surdo perto de sua morte e compunha de ouvido, o que não deixa de ser uma ironia.

Tropeçava seus passos em direção a outro beijo com os olhos enxergando o caminho quando a luz e a fumaça e o som deixavam, sua cara sonsa e meio bovina não prestava atenção em nada, ele ainda estava dentro da boca que o roubara do chão. Nessa toada, pisava em ovos, amassava cometas e chutava estrelas no caminho. Um homem perdido, ele havia se tornado e não procurava uma saída de volta ao seu caminho de bem.

Com aquele beijo em si, foi capaz de conquistar o mundo e pagar todas as suas dívidas. Escreveu sonetos e catalogou orquídeas pelo cheiro. Foi embora para a Passárgada jogar xadrez com o rei, muito amigo seu e mesmo chegou a confessar que não precisava de mais nada, pois era um homem que podia contar com um beijo em cada esquina.

Quando o beijo virou névoa, foi difícil explicar a ele que havia mais coisas na vida do que duas línguas, quatro lábios, mais de cinqüenta dentes e quase trezentos batimentos cardíacos por minuto. Ele secou, e secou, e secou, como a audição de Beethoven num fim de festa. E longe da Passárgada.

segunda-feira, dezembro 01, 2003

Rosa do Pixinguinha

Sabem aquela música que diz "my neck, my back, lick my pussy and my crack"? Pois bem, virei fã. Descobri a canção no último sábado, zapeando através das rádios FMs cariocas em busca de novidades do mundo pop. É uma tal de Khia que canta, uma mocinha desbocada que na capa de seu último disco, Thug Misses, aparece literalmente de quatro. E, claro, na capa também há um Parental Advisory bem grande.

E como eu fiquei muito tempo ausente do Inventando Dogmas, ficou-se um bom tempo sem se falar de cunnilingus por aqui. Não que o God, meu parceiro neste espaço, seja um leigo no assunto, mas o que ele curte mesmo é a contracultura, e de contra o cunnilingus não tem nada. Cunnilingus é pop, como prova com inigualável talento a tal Khia. Depois de ouvir sua canção, comentei com amigos minha descoberta e fiquei com cara de pateta ao saber que já não era novidade para ninguém.

Mas nenhum deles, os amigos, soube me dizer o significado da palavra "crack". Vejam, minha imaginação pode funcionar bem, até me divertir, mas a dúvida sempre restará. Portanto, alguém poderia me explicar, sem poupar palavras, o que a rapper pede para fazerem com o "lick my carck"?

Lembro de uma história que me foi contada em Eunápolis, cidadezinha baiana egocêntrica próxima a Porto Seguro. Um bom baianinho local - João, seu nome - brigou com sua esposa - Maria - no armazém da esquina de sua rua, que eu não me recordo o nome, com a avenida principal da cidade, que eu também não me recordo o nome, mas aposto que tinha um Magalhães em uma destas vias públicas. Maria reclamava que João não queria comprar pêssegos, pobrezinhos, preteridos por ameixas. Mas Maria reclamava, reclamava, reclamava muito. João, apesar de baiano e paciente, ainda era brasileiro e macho, sim senhor. Inadmissível para ele aceitar que sua esposa o destratasse logo na frente de José, seu ex-cunhado, dono do armazém.

- Maria, minha rainha, você vai ficar me tratando assim mesmo depois de eu ter passado bons minutos lambendo seu cu nesta manhã?

E Maria era baiana, gente. Mas tinha mãe cearense e avó paraibana. Pobre João, além de levar porrada, ainda acabou sem mulher.

(agora eu não estou ouvindo a Khia, mas sim o Pixinguinha cantando Rosa. E tenho certeza que as duas canções tratam de assuntos muito semelhantes.)

Outro dia desses estava conferindo a vizinhança enquanto esperava um e-mail, o tempo melhorar e a hora de sair. Eis que no blog das Migas (que é bem bacaninha até) estava o relato abaixo, feito pela MigaCap:
"Esses dias eu estava olhando calcinha e soutian na Renner e cheguei a uma conclusão, existe uma máfia de academias de ginástica e cirurgiões plásticos que controla o tamanho das roupas. As calcinhas estão cada vez menores, e os soutians cada vez maiores, eu vi um conjuntinho que o soutian P de repente caberia em mim, mas pra calcinha G caber eu teria que perder uns 5 quilos, vamos supor que eu entrasse na academia malhasse igual a uma condenada e conseguisse emagrecer 5 quilos, ótimo! Agora a calcinha cabe em mim! Mas e o soutian? Não cabe mais... Aí só silicone mesmo. Acho que não sou só eu, 99% das mulheres teriam o mesmo problema, essa nova mulher não existe naturalmente."

Por alguma razão, achei que precisava me solidarizar com a causa da guria. A última frase do relato dela é um lembrete para todos nós, migos e migas, de que talvez seria bacana a gente lembrar de vez em quando que somos apenas seres humanos, e que nosso grande barato é a singularidade. Possuímos todos e cada um cores, formas, vozes, cheiros e tamanhos unos ao gosto do freguês.

Só que o homem, especialmente o espécime ocidental que venceu a Europa e desbravou o resto do mundo, desde que se conhece por gente tem uma ridícula vergonha de seu corpo. Seus primos índios e africanos não se importavam muito em cobrir suas vergonhas e pudores, porém também não se importavam muito com a pólvora nem com grandes viagens marítimas e eis-me aqui, a léguas de Portugal escrevendo em português e vestido. De quebra, o homem ocidental desde muito se guia por Guerras, Leis e o Cristianismo e todos os três censuram a nudez, o corpo aberto, a transparência e até o bom e velho coito. Faz-se necessário simular, esconder, fingir e iludir. O inimigo, verdadeiro demônio anárquico, anda à espreita. Talvez o clichê de filmes pseudo-pornôs de ir até o quarto para vestir algo mais confortável esteja apenas nos dizendo que roupas demais ou apenas roupas não passam de convenção social. A intimidade pede algo mais natural e humano como a nudez, até por razões práticas (e diria eu lúdicas). Que atire a primeira pedra quem traja sapatos dentro de casa num domingo à tarde. Aliás, atire a pedra e me explique porque publicitários quebram a cabeça tentando nos fazer crer que os tais sapatos são tão bons que você pensa estar descalço com eles.

Pois que algumas revoluções políticas, tecnológicas e sociais deram ao homem deste nosso passado século um poder de interferir no meio onde vive de maneiras tão plurais que algumas delas ainda não são totalmente críveis para nós. Imaginem que na minha época (desculpem-me o parêntese desnecessário e longo, mas eu preciso dizer que adoro esta expressão: "na minha época") o Michael Jackson era mulatinho. Pouco antes de eu nascer, o sujeiro era um ícone negro, negão mesmo, com cabelo black pow e nariz de Mussum. (Imaginem agora que os filhos dele um dia hão de descobrir o que o pai andou fazendo após a década de 80) Eu lembro das garotas do colégio, do curso de inglês, da natação, do basquete e até do catecismo que povoaram minha infância e adolescência. Ênfase na minha adolescência, vamos deixar isso claro. Elas poderiam ser um pouco menos magras, menos brancas ou ter cabelos menos lisos mas a gente aceitava numa boa, e de repente aquele molar meio torto era o que dava um brilho que só você veria no sorriso dela e o levava a tirá-la para dançar juntinho a música da novela. O Pato Fu até tem uma música que canta que o amor é anormal e eu não serei o idiota que irá discordar dela.

Eu nunca deixo de pensar nessas meninas já adultas quando circulo no New York City Center, a grande meca ecumênica da nossa juventude bonzeada. As meninas que circulam no New York parecem todas muito simpáticas e algumas são realmente bonitas quando saem da cama com olho remelento e cabelo embaraçado, só que todas parecem iguais, como se fossem filhas da mesmíssima mãe que pode tanto ser a mais recente bigbróder ou a próxima britney. Verdadeiras clones. As mesmas roupas, as mesmas bundas empinadas, os mesmos peitos prontos para a guerra, os mesmos umbigos perfurados por adereços metálicos e talvez algumas precisem de horas a mais em cabelereiros para obter os mesmos penteados e coloridos. Deve ser uma experiência e tanto pesquisar o álbum de fotos de suas famílias e ver como elas eram antes de entrarem na linha de montagem.

O homem, por meio da cirurgia plástica, exercícios físicos e aditivos químicos, remodelou a própria beleza do corpo. A beleza do corpo desde o início do século mais do que mero acaso, virou indústria. Não se nasce belo, fica-se belo. O belo deixou há tempos de ser um conceito subjetivo para virar uma marca, uma grife para ficar melhor. Bündchen, Crawford, S(c)heila. Proibiram as barriguinhas das meninas, seus cabelos pixains, seus dentes tortos e até as suas sardas, crime imperdoável. Quando a engraçadinha Mylla Christie saiu na Playboy, suas sardinhas que envernizavam a capa da revista sumiram fotoshopicamente no ensaio. As fotos ficaram supimpas, reconheço, mas a beleza de Mylla foi industrialmente manipulada para ser bela. E quem era homem em 97 sabe muito bem que as sardinhas de Mylla eram tão gostosas de ver quanto seu sorriso lolito ou suas formas sugestivas. Ela mesma apareceu na tevê tempos atrás com os outrora caracóis alisados e braços musculosos. Quem não lembra da Froticeira? As meninas do Tchan, antes e depois? Os e-mails com fotos da Kelly Key pré-Latino?

Parece que a MigaCap está certa, essa nova mulher não existe naturalmente. Mas nós, de tão expostos a bundas e peitos pré-fabricados, estamos nos esquecendo de que um dia eles não eram todos iguais e tão grandes. Antigamente, uma mulher peituda podia ser referência tal qual um careca; o peitão era algo dela, singular. Era uma forma que alguns poderiam gostar, outros não. Agora os peitos enormes e roliços são o objetivo final, tal qual a cintura enxuta, os cabelos lisos e a bunda saliente. Quem não os têm, não é mais bela. O referencial da indústria é tão desumano que algumas das beldades concorrem entre si para ver quem se mutila mais em busca de ser bela e não raro revistas e jornais trazem matérias comparando o número de cirurgias, dietas e até os litros de silicone que envolvem a beleza delas.

Para você, querida leitora, que resistiu bravamente até aqui neste estilo desfocado e tortuoso, eu só posso sugerir que fuja dessa beleza industrial. Homem é burro, mas é homem e gosta de mulher. Aqueles que ainda forem humanos o suficiente serão capazes de reconhecer a beleza que nos é natural e não se encontra apenas dentro de certas medidas métricas. Não tenha dúvidas de que vocês todas são bonitas, cada uma à sua maneira, que bacana, porque o belo é o que não se repete. E tenha em mente que se todas vocês fossem réplicas da Cicarelli, a primeira Henriqueta Brieba que aparecesse deixaria todas no sapato.