segunda-feira, outubro 25, 2004

The end of laughter and soft lies, the end of nights we tried to die, This is the end

Definitivamente, eu preciso de um novo desafio. Tenho sofrido de falta de motivação, causada por sei lá o quê, mas com efeitos devastadores no meu cotidiano. Sempre baseei minha vida na busca pelo dia seguinte. Amanhã faria seis gols na pelada, escreveria mais um capítulo do meu eternamente inacabado romance, conseguiria aquela grande reportagem e daria a grande trepada. Só que, para mim, sexo é uma atividade solitária há mais de duas semanas, o jornalismo é terminar minhas matérias o mais rápido possível para vir embora para casa, meu talento é muito duvidoso e o futebol é um encontro de amigos que precede a cerveja. Essa, a cerveja, sim, tem estado presente no meu dia a dia. Bêbado, ao menos, eu me esqueço da falta que uma motivação faz.

Minha vida tem se resumido em acordar tarde, ir para o trabalho, cumprir minhas funções, tomar café, voltar para casa cedo e dormir tarde. O máximo que faço de produtivo é me exercitar um pouco - com a mente problemática, o corpo pelo menos tem que estar de pé. Preencho os intervalos dessas tarefas com uma dose de whisky ou alguns copos de cerveja, para evitar pensar numa solução. Estou virando o típico adulto urbano medíocre que eu sempre critiquei. Se eu anunciar casamento e aparecer de mocassim bege, me internem porque o caso estará perdido.

Por favor, entendam que não acho que temos que ser rebeldes. Mas acho que precisamos de tesão pela vida. Uma vez, quando moleque, perguntei para o padre se estuprar uma anã era pecado ou caridade. Mas, Dom João, o senhor tem que entender que as anãs têm muita dificuldade em conseguir sexo e vontade de sobra. Ele não entendeu e ainda me deu uma bronca pela impureza e preconceito em meus pensamentos. Eu era uma criança, ora bolas, e adorava ver TV às altas horas da noite, naqueles horários que crianças não deveriam ver TV.

Como desafio, não me imagino estuprando uma anã, mas há coisas semelhantes que poderiam me animar. Já fui dirigindo sozinho (com namorada que não dirige) para Salvador com um carro batido e sem planejamento algum. Já saí de San Diego com 17 anos para curtir uma noche no México sem ter idéia como voltar. Já invadi prédio em construção para transar. Já parei elevador para transar. Já rodei todas as ruelas da Rocinha com uma câmera de vídeo na mão para fazer projeto social. Eu tinha tesão nessas coisas e, hoje, tenho a sensação que não faria nem metade disso. E, vejam bem, não listei nada de muito especial. São apenas detalhes que podem fazer a vida de alguém mais interessante.

Um ótimo exemplo é o "suequinho". Em todos os meus trabalhos de faculdade eu dava um jeito de encaixar um típico menino sueco, abastado em seu país de origem, mas que vivia de esmolas aqui no Brasil. Era um desafio que dava ânimo para escrever sobre teorias da comunicação. Me formei graças a ele, não resta dúvida. Só que, hoje, até as coisas que eu escrevo são chatas, melancólicas, sem a surpresa que um menino sueco pedindo uma ajuda na Avenida das Américas, pelo amor de Odin, pode causar.

Um dos meus filmes favoritos é Apocalypse Now. Além de todas as balelas anti-bélicas, ele tem o dom de apresentar balelas anti-humanas sem ser careta e piegas. Porque, vejam bem, o grande vilão não é o Coronel Kurtz (Brando), ensandecido, lutando para (des)construir um mundo a sua imagem. Tampouco é Kilgore (Duvall), perseguindo seus inimigos com determinação incomum e com ótimo gosto musical. O vilão é o Willard (Sheen) mesmo. É ele que não tem motivação nem para continuar na guerra, nem para tentar retornar. Faz apenas o que o mandam, esperando a morte. No fim, oká, Kurtz ainda chega a dar uma balançada no coração do Willard, mas aí já se passaram mais de duas horas e meia de mediocridade. Não dá tempo para voltar atrás.

Contudo, apesar de um quarto de século passado, vou me dar mais uma chance para consertar as coisas, antes de chutar o balde e ir em busca de mais um recomeço. Tenho a mania de identificar os inúmeros defeitos das pessoas e coisas a minha volta e sempre as culpei por minha falta de motivação. Mas, quando se percebe que todas as pessoas que importam, em um momento ou outro, passam a te odiar, chega a hora de olhar novamente para o próprio umbigo. Se o problema, portanto, é comigo, vamos mudar o problema.

Meu primeiro compromisso é me tornar Mister Universo em 2006 (2005 já está em cima, e não creio que dê tempo). Isso pode ser considerado um dogma e voltarei a tratar do assunto aqui. O resto vai aparecendo aos poucos.

sábado, outubro 23, 2004

Toda Forma De Amor
Cena 1

Antônio estava um tanto desnorteado com aquela boca que lhe lambia as bolas e lhe fagocitava o pênis duro feito um pau. As lentes de seu Rayban a lo cubano embaçavam dentro do automóvel fechado, suas mãos pareciam assustadas e virgens com aquela impaciência que dominava a sua virilha e, tal qual seu olhar, não conseguiam relaxar em ponto algum da noite que caía e camuflava o pequeno Fiat negro na penumbra de uma esquina esquecida pela iluminação municipal. Quando suas mãos pousavam ofegantes nos cabelos curtos e quase calvos da cabeça onde estava aquela boca que parecia lhe amar com violência é que Antônio se dava conta que era um homem, o seu primeiro homem, José.

E aquilo, um homem em seu sexo, quem poderia adivinhar, estava deveras agradável. Quando se deu conta de que estava gozando, Antônio ficou assustado, gritou "não!", suas mãos impúberes quiseram fugir e vá lá saber o que mais pode acontecer diante do primeiro orgasmo além do gozo em cada um, pois temeu que mulher alguma fosse ser capaz de apagar de seu corpo o bafo de José e, de fato, teve a certeza de que não haveria mulher o bastante naquele mundo para lhe ser tão homem feito José. Estou perdido, estou perdido, foi o que ele disse entre os últimos estertores daquele gozo, estou perdido, e então José beijou com a boca cheia de pavor e suas mãos castas redescobriram a barba por fazer de José, algo que nunca haviam descoberto num beijo e Antônio estava perdido.

José tirou de seus olhos os óculos escuros e olhou para ele como se pedisse uma resposta. Antônio não tinha resposta alguma. Antônio tinha dois casamentos falidos, três filhos homens, quarenta e seis anos de vida e dívidas no cartão. Antônio tinha uma cicatriz no queixo, uma camisa autografada do Roberto Dinamite no armário de casa e o Transa do Caetano com Nine Out Of Ten arranhada, mas não conseguia ter uma resposta para José. Abriu a boca, mas som algum parecia sair dela. E assim ficaram por minutos, talvez horas e dias, mas decerto não se passaram breves segundos porque Antônio conseguiu dar a resposta que José desejava. Você é o meu primeiro homem, José. E José sorriu pela primeira vez naquela noite, estava perdido.

terça-feira, outubro 19, 2004

Fuck Bush

É isso aí, pessoal, John Kerry também merece a chance de mostrar ao mundo que pode ser um idiota.

segunda-feira, outubro 18, 2004

FMI PUTO

Os hermanos argentinos devem morrer de orgulho toda vez que assistem a "O Filho da Noiva". Se não o fazem, deveriam. Há sutilezas em cada personagem que remetem ao espírito, não só do argentino, mas de todo el pueblo de la America del Sur que precisa vencer a luta diária da sobrevivência ao mesmo tempo em que se permite sonhar dias felizes, não felizes apesar de, mas felizes e ponto final. Os vícios das personagens sim, caricaturam os modos portenhos.

A grande sacada do diretor Campanella foi usar do cinismo para representar o amor, porque o amor é cínico, como a boa verdade. E "O Filho da Noiva" versa em imagens sobre a necessidade do amor através de metáforas envolvendo o coração, o doente coração argentino do protagonista. E, assim, o filme também é uma declaração de amor à terra de Mario Kemps, cínica e apaixonada. Apaixonada a ponto de haver uma pixação bem-vistosa na parede de um restaurante falido observado pelo protagonista que grita por bons quase cinco segundos na tela: FMI PUTO. Sem concessões, sem meias-medidas, sem polidez pra agradar ao pessoal do Oscar.

E só por esta alfinetada, e, vejam bem, o filme é quase uma açucarada comédia romântica, já há razões de sobra para o argentino sentir orgulho de seu cinema. É interessante, aliás, como o cinema argentino tem paixão por retratar seus povo através de seus vícios (vejam também Plata Quemada e Nove Rainhas), e desses vícios, construir caminhos e descaminhos para mostrar que também graças a eles, pode-se vencer afinal. Trata-se de se reconhecer, aquele velho primeiro passo da cartilha dos alcoólatras anônimos - se você se reconhece enquanto doente, então já começou a se curar.

Aqui no Brasil nem tudo está perdido. Beto Brant e Jorge Furtado conseguem enfiar a mão em nossa cartilha de jeitinhos e fazer cinemão, nos dizer umas boas verdades e valorizar nosso ingresso. Lógico, o preço disso tudo, da tal retomada, é aturar carandirus, olgas e afins. Já dizia o poeta, vence na vida quem diz sim. Eu vou continuar torcendo pra quem diz não e mostra o dedo só pra provocar.

quarta-feira, outubro 13, 2004

Diário de um cafajeste ou Como chegar no Andaraí?

Quando Karen me disse que morava no Andaraí, confesso que meus joelhos fraquejaram. Eu não sei coisa alguma sobre o Andaraí. Provavelmente já passei pelo bairro, mas nem sequer me dei conta. Eu tinha prometido que buscaria a recém conhecida moça em casa no dia seguinte, para leva-la ao cinema, a um restaurante e, confesso meus interesses, a um motel. O problema é que eu tinha vendido um discurso de que era um profundo conhecedor de toda a cidade, um jornalista rodado que fazia matérias em qualquer lugar que me pedissem com uma destreza sempre admirável.

E não era primeira vez que isso acontecia. Certa vez marquei de sair com uma menina que morava no Rocha. E eu nunca tinha ouvido falar nesse tal Rocha. É perto do Riachuelo, me disse a moça. Tive que ligar para cinco pessoas para aprender como chegar de ônibus no Rocha. Não foi uma tarefa fácil, nem mesmo compensadora.

Portanto, no instante em que Karen, aquela menina linda cujos cabelos ruivos eu estava doido para conferir a autenticidade, falou Andaraí, logo vi que estava me metendo em outra furada. Dessa vez eu não poderia ir de ônibus. Além de rodado, meu discurso dizia que eu era bem sucedido, rico e com condução própria. André, o garotão malandrão.

Conheci Karen na fila do cinema. Tinham duas pessoas na minha frente e uma atrás. Ela chutou meu calcanhar direito com seu pé esquerdo. Ah, me desculpe, foi sem querer, eu juro. Intenções à parte, não resisto mesmo a uma ruiva. O charme foi inevitável. Tudo bem, eu sei que não foi de propósito, mas está doendo um pouco, sabe? Ela, amável, quase chorou. Pediu dúzias de desculpas, acho que, se tivesse um pouco mais de intimidade, até diria que beijaria meu calcanhar para passar a dor que não existia e eu inventara para me aproximar mais da moça. Karen, pobrezinha, caiu naquele discurso canastra como uma boba, uma adorável boba.

Entramos juntos na sala e, dispostos a um sessão solitária de cinema, acabamos assistindo a Meninos de Deus juntos. Um bom filme, com doses certas de diversão, tristeza e, mais importante, romance. Risos, gracejos e beijos foram inevitáveis. Lá pelos 46 minutos de filme, simplesmente perguntei se ela estava gostando. Sim, e você? Do filme, sim, mas acho que eu estaria melhor se você me permitisse roubar um beijo. Tinha essa mania de "roubar" um beijo, acreditava que causava alguma sensação diferente nas moças.

Como vocês podem imaginar, ela consentiu. Tenho que explicar uma coisa, antes de continuar. Nunca, simplesmente nunca havia conseguido um beijo de alguém que eu acabara de conhecer na fila do cinema, sabe? E eu era o rei das filas. As de banco, então, eram uma maravilha para rapazes com segundas intenções. Porque se há uma moça bonita numa fila de banco, pode acreditar, ela está precisando de alguma atenção. E, nessas horas, a aproximação é facilitada. É lógico que essa era uma teoria desenvolvida por mim, baseada apenas num empirismo de anos. Mas quase sempre funcionava. Oi, essa coisa de esperar na fila para pagar contas é terrível, não? Proporciona dois momentos desagradáveis, a fila e as contas, não? E ainda é uma perda de tempo, não? Sair do desagrado que era enfrentar uma fila para o prazer de uma conversa era ótimo, para as moças.

Outra vantagem das filas de banco é que as pessoas não têm para onde correr. Eu calculava quantos infelizes ainda faltavam para chegarmos ao caixa e programava toda minha cantada para aquele tempo exato. O objetivo era entreter a moça até que chegasse sua vez. O próximo, por favor. Olha, meu bem, o caixa está te chamando. Aquele tom de voz blasé e desinteressado conquistava qualquer uma. Depois de pagar as contas, elas sempre me esperavam para uma palavrinha a mais.

Acho que até mesmo num banco do Andaraí eu alcançaria bons resultados. Mas com o cinema nunca deu certo. Era difícil encontrar uma moça sozinha no cinema que não quisesse realmente estar sozinha. Ver filmes sozinho é uma das práticas mais interessantes criada pela modernidade, afinal. Karen, então, era um achado, um item a mais para o meu currículo.

Para o prazer ser maior faltava apenas vencer aquele Andaraí orgulhoso. Não acredito que exista alguém que more no Andaraí sem se mostrar orgulhoso disso. Ela poderia até não gostar do bairro, mas duvido que revelaria esse defeito assim, com facilidade para um recém conhecido.

O combinado era que eu aparecesse por volta das 18h, para pegá-la em casa. Mas uma pesquisa no site da RioListas, à noite, em minha casa, me fez desistir. Ela havia dito que morava na Rua Andaraí. Escrevi Silva no campo nome, Rio de Janeiro no campo cidade, RJ no campo estado e Andaraí no campo endereço. E todos, exatamente todos os resultados gerados mostravam Silvas que moravam na Rua Andaraí. Até apareceu uma Rua Pico Andaraí, mas essa fica na Taquara. No Andaraí mesmo, só a Rua Andaraí.

Meu preconceito, infelizmente, falou mais alto do que a vontade de conhecer Karen mais a fundo. Imagina se a tal Rua Andaraí for apenas de mão única. Seriam muitos bairros estranhos para passar apenas para sair com uma ruiva. Não acho que valeria a pena. Não apareci no encontro e lamentei não ter tido a oportunidade de comer Karen.

sexta-feira, outubro 01, 2004

Só pra constar: Sabiam que este aqui vem a ser o post de número 200 do blog? Parabéns pra nós.

Um espécime de monstro

Creio que estas palavras a seguir só terão lá a sua graça para aqueles que, como eu, possuem o desvio de personalidade adolescente de levar o tal do roquenrou mais a sério do que a boa convivência social recomenda. Portanto, nobre leitor(a), se não for o seu caso, perca suas esperanças de ler algo de interessante daqui em diante, porque vou outra vez falar do rock. Sim, do rock. Pior, do Metallica.

Conhecem Metallica? Acho que sim, né? Imagino até que grande parte de vocês possuem em casa o famoso "Álbum Preto do Metallica", o Black Album para os mais íntimos e, para os menos conhecedores, o CD que tem "Enter Sandman", "Nothing Else Matters" e "The Unforgiven" dentro. Pois bem, o já afamado Festival do Rio trouxe em sua programação deste ano um documentário que flagrava o Metallica na gravação de seu último álbum de estúdio, denominado Saint Anger (algo como Santa Fúria).

Sim, jovens, este escriba que ostenta um cheveiro do Iron Maiden atendeu ao chamado do metal e segunda passada após o expediente, correu para um cinema no centro da cidade conferir a pelota. E, digo a vocês, um filme irado. O foco do documentário é o processo de criação do Saint Anger, que viria a ser o primeiro álbum de estúdio da banda após meia década. E, como foi um filme que os músicos queriam fazer, tinha tudo para ser uma armação, com trocas de elogios, rasgação de seda e flashbacks duvidosos, mas não, não é.

Durante a gravação de St. Anger, o Metallica quase acabou por duas vezes devido a desentendimentos entre o batera Lars Ulrich e o vocalista e guitarrista James Hetfield, os dois principais compositores. Os caras se odeiam. A situação de desespero da banda era tal que a gravadora arrumou para eles um terapeuta de grupo que os acompanhou por toda a sessão do St. Anger, que durou mais de um ano pra ser feito. Ainda no documentário, figuram o ex-baixista Jason Newsted e o guitarrista Dave Mustaine, que foi sacado da banda devido a problemas com bebidas e drogas nos primeiros anos de Metallica. Tudo, todas as circunstâncias parecem conspirar contra a gravação de St. Anger. Mas o disco saiu e a banda sobreviveu mesmo assim. Eu sei, o St. Anger não é bem uma brastemp, mas relevem.

Fiquei matutando depois do filme porque tem uma frase até conhecida do Mick Jagger, ele diz que o rock só acontece quando há um risco a ser corrido. Faz sentido. Não se faz revolução sem derramento de sangue, e os Bitols nem se falavam mais durante o Let It Be. O grande mérito de "Metallica: Some Kind Of Monster" é esse de desnudar o cotidiano de uma grande banda, transformar os caras em gente feito eu ou você, que envelhecem, possuem famílias - quem imagina o bronco James Hetfield acompanhando a apresentação de balé da sua filhota? - e trabalham, porque o Metallica é o emprego deles. Aquela pasmaceira do rock poder mudar o mundo, de estar numa banda é viver na farra, de catar o violão e compor um sucesso radiofônico em 3 minutos e outros clichês que povoam a mente das pessoas que levam fé no Linkin Park vão todos ralo abaixo. Há momentos em que estar no Metallica é tão sacal quanto ser caixa de supermercado. E por tudo isso, o documentário só acrescenta mais brilho não só aos caras da banda, mas ao próprio rock.

Pena que dificilmente o filme vai entrar em cartaz, mas, se algum dia um desses GNTs da vida acharem boa idéia o exibir, não se façam de rogados e atendam ao chamado do Metallica. E levantem suas mãos em chifres, pela glória do rock'n'roll.