terça-feira, fevereiro 07, 2006

Evolução

Não se espantem, este é mesmo o terceiro dogma escrito e publicado num mesmo dia. Também não me julguem achando que não tenho nada para fazer no trabalho. Não é verdade. Além de escrever bastante rápido (o que não é a mesma coisa do que escrever bastante bem), percebi que fiquei muito tempo sem atualizar isso aqui e resolvi compensar com mais de uma besteira. No caso, mais de duas.

Além disso, esta última história tem sua relevância para entender o ser-humano e para explicar como me tornei um homem evoluído. Vindo para o trabalho hoje, quase tomei um tiro. Passava por um dos túneis da Linha Amarela, andando devagar pela direita e ouvindo Chico. Conhecem "Eu te amo"? Sabem "Como, se nos amamos feito dois pagãos/Meus seios ainda estão em tuas mãos/Me explica com que cara eu vou sair"? Não é momento para se estressar, definitivamente.

Não andava como uma lesma. Estava a uns 100 km/h. E na pista da direita, repito. Mesmo assim, um imbecil grudou na minha traseira, piscou os faróis e insistiu que eu saísse para que ele ultrapassasse. Foi demais. A pista correta para ultrapassagens, como todos sabem, é a da esquerda. Aquele infeliz forçando a barra pela direita definitivamente não fazia sentido e eu não cedi, obviamente.

Não saí da direita, não dei passagem e ainda coloquei o braço para fora, apontando a pista da esquerda como a correta para aquele tipo de atitude estúpida e fiz um sinal feio com o dedo médio. Maldito André e sua intempestividade. O infeliz me ultrapassou pela pista do meio, fez sinais não mais honrosos para mim e ainda fechou meu carro. Não sei se ele pretendia provocar um acidente ou apenas me assustar. Sei que definitivamente nada adiantou. Não me assusto com facilidade e dirijo muito bem para um idiota me fazer bater de carro.

Ele, porém, prosseguiu com as gracinhas até o pedágio. Lá, parou o carro em frente ao meu, na pista do passe expresso, local de onde não era possível fugir. Havia um guarda municipal no local, o que me deu certa tranqüilidade. Quando estamos certos, não costumamos temer represálias oficiais. O sujeito falou qualquer coisa para o guarda, saltou do carro e veio em minha direção.

Esses segundos duram em média milésimos de segundos. Eu tenho uma certa vantagem em relação a outrem de estar preparado para surpresas durante a vida. É isso, pelo menos, o que eu laureio por aí. Deve-se pensar rápido para não se fazer besteiras, ensinavam os Dons no São Bento. Na minha profissão, então, é importante estar preparado para respostas e atitudes de todo tipo, a fim de não ser enganado. A única pessoa que consegue me surpreender, aliás, é minha namorada. Não vou dizer se negativa ou positivamente porque não quero arrumar confusão.

O que quero dizer mesmo é que o sujeito me ameaçou, perguntou qual minha moral para xingá-lo com o dedo médio e disse que eu deveria tomar cuidado para não morrer. Sua camisa era larga e parecia haver algum volume.

Nessa situação, normalmente eu sairia do carro e deflagraria uma discussão que, possivelmente, terminaria com dois trogloditas rolando no chão. Mas me contive. Muito pela possibilidade de ele estar armado, muito pela falta de necessidade de um ato de afirmação machista.

Assim, eu apenas o lembrei de que ele estava correndo demais na pista da direita, mas pedi desculpas pelo meu gesto. A maturidade me trouxe humildade e consegui conter meu orgulho.

O guarda, depois, veio dizer que o sujeito estava um pouco alterado e que eu deveria relevar. O cara, provavelmente, era policial. Retratos de uma cidade onde pessoas agem sem pensar, brigam, atiram e fazem suas leis. Eu, pelo menos, me senti superior.