"We all need someone we can dream on..." (em Fernando de Noronha)
Descendo pela Vila dos Remédios chega-se ao bar do Cachorro, uma das poucas opções de diversão de Fernando de Noronha, fora as praias. De dia, valia pelos bons sanduíches naturais, vendidos a preços honestos, e por uma música ambiente recheada de MPB. À noite, o bar ficava cheio de nativos e turistas dançando forró. O atendimento demorava um pouco, mas era acima da média da ilha.
Eu estava hospedado na Vila do Trinta, separada da Dos Remédios pela BR 363. Sempre me perguntei se existiam tantas rodovias federais cortando o país para chegar a quase quatro centenas delas ou se pulam alguns números de acordo com o que indicam os astros. Um dia eu ainda pesquiso sobre o assunto.
Na minha pousada, a Monsieur Rocha, havia um simpático, mas frio, café na recepção, com pão doce, pão de queijo e biscoitos de água e sal. Havia chá também. Era ali que eu parava para matar a fome depois de uma baseado ou a ressaca depois de uma bebedeira. Posso dizer que aquele café frio foi fundamental para minha viagem.
Fiquei sete dias em Fernando de Noronha, mas foi como se tivesse ficado dois meses. Não por monotonia, deixo claro. É que realizei tantas coisas que não acharia possível em apenas uma semana, se me perguntassem dias antes. O whisky não me deixava dormir. Na última vez que viajei para uma ilha, Cuba, o rum e os charutos me mantiveram acordado. Também passei uma semana lá e usei o mesmo bloco em que escrevo este texto para escrever outros. Vejam só, havia boas idéias nunca concluídas:
"Os cubanos passaram a pedir dinheiro. Deve existir uma conspiração e eu sou o foco central dela. Ontem, quando cheguei, só conversavam comigo simpaticamente, mas não pediam nada. Hoje, acredito, todos se comunicaram entre si e sabem que eu sou um alvo. Sou o brasileiro que gosta de futebol e que jura ser vizinho do Thiago Lacerda. O papo é sempre o mesmo e envolve filhos e pouco leite no libreto mensal. Passei a me vestir mal o que, no meu caso, não é exatamente difícil. Os cubanos modernos, porém, não usam barba e a minha à la Guevara entrega minha origem estrangeira. Maldita modernidade".
"Conheci um argentino professor de kitesurf que estava há um mês em Havana para dar aulas. E, vocês sabem, se não tenho paciência para surfistas brasileiros, não seria um kitesurfista argentino que iria me cativar. Sim, assumo o preconceito. Além do mais, o cara só queria falar das praias cubanas e brasileiras. ¿Por qué sólo estuve em Habana? Porque eu quis, porra. Outra argentina, uma pequenina vestindo blusa branca de manga comprida, sentou na minha frente e me olhava com a discrição típica dos latinos. Ou seja, nenhuma. Foi um pouco constrangedor, mas ela era bem bonita, admito. Estava à vontade na cadeira, sentada em cima de uma das pernas, enquanto comia macarrão com salsichas vermelhas. Apaixonante."
Viajei para Cuba exatamente um ano antes de Noronha, coincidentemente. Em ambos os casos, as viagens foram marcadas em cima da hora e não estavam no meu planejamento para o ano. As circunstâncias, porém, foram distintas, mas isso eu deixo para contar outro dia.
Numa das noites em Noronha, a terceira de minha estadia, conheci uma francesa, chamada Jeanete, justamente no Bar do Chachorro, aquele depois da descida da Vila dos Remédios. Ela viajava com uma amiga, Francie, ou algo assim, e bebia, tímida, uma cerveja quente na mesa mais afastada da pista de dança quando a vi pela primeira vez.
Eu não tinha nada a perder. Era casado, sim, mas minha esposa ficara no Rio menos por trabalho do que por falta de saco para aturar o que ela denominava minhas "aventuras". Sabem aquelas chamadas para filmes na TV? "Eles vão enfrentar diversos perigos e viver grandes aventuras". A escrota sempre me sacaneava, dizendo que eu era um eterno personagem da Sessão da Tarde. Pior para ela, pensei.
Meu francês não era dos melhores, mas eu e Jeanete nos comunicávamos bem em inglês. Minha aproximação, porém, foi em português.
Fui até a mesa dela entre um xote e outro, na cara-dura mesmo. O óbvio seria convidá-la para dançar, mas sou péssimo dançarino e poderia pôr tudo a perder assim. A dança ficaria para depois. E o menos óbvio, todo mundo sabe, surpreende e causa boa impressão.
- Oi, eu me chamo André, André Miranda. Sou jornalista, carioca. Pensei que você seria a companhia perfeita para pegar um cineminha amanhã.
A Francie, ou algo assim, dançava com um nativo, meio animada, meio desengonçada. O momento foi perfeito, mas, ao ignorar que Jeanete não entendia português, minha piada idiota sobre o cinema inexistente na ilha não foi compreendida. Ainda bem.
No dia seguinte, como combinamos entre alguma dança e alguns beijos naquele forró, acordei cedo e fui buscá-la em sua pousada na Floresta Nova com um bugre alugado. Depois de dirigir uns dez minutos, caminhar um pouco e descer pela fenda na encosta, chegamos à Baía do Sancho antes das 7h.
Ficamos duas horas completamente sozinhos na praia e após os primeiros vinte minutos já estávamos nus, trepando na areia ou no mar. Jeanete me deixava excitado me chamando de mon cheri e pedindo com doçura coisas em francês que definitivamente eu não compreendia. Interpretei livremente e fiz tudo o que quis com a francesa, sem pudores de ambas as partes. O clímax aconteceu em cima de uma pedra, com seus joelhos sangrando. "Let it bleed", ela disse. E, caralho, como eu gosto de Rolling Stones. Gozei três vezes, direto, em cima da pedra. Nunca tinha acontecido de eu gozar três vezes, assim, direto, sem parar. Não pude deixar de cantarolar "if you want it, baby, you can bleed on me".
Aquele, o dia da Baía do Sancho, era seu último em Noronha. À tarde, levei Jeanete e Francie, ou algo assim, para o aeroporto. Nos despedimos com um beijo e marcamos de nos encontrar dentro de um ano na Grande Canária, Espanha. Sempre uma ilha. À noite, tomei duas doses de whisky, acendi um baseado e voltei ao Bar do Cachorro. Não dancei. Só consegui ficar sentado olhando a lua refletindo no mar.