domingo, agosto 07, 2005

O amor de cada um (xv)

Eu tinha acabado de sair de um bar na Rua do Matoso, próximo à Praça da Bandeira, onde tomei dois Dudus. Era uma mistura de quinado com conhaque Dubar, inventando pelo dono do boteco, um paraíba chamado Eduardo. Ruim, mas tragável. Fazia frio e a bebida naquela dia foi menos vício do que necessidade. A cidade estava vazia às 2h e andei até a Rua Ceará, a fim de procurar vida e calor. Mas nem as prostitutas pareciam interessantes. Eram de qualidade duvidosa.

Caminhei, então, em direção à Rodoviária Novo Rio, pela Leopoldina, para tentar encontrar algum viajante à espera de um ônibus. Seria uma boa companhia, pensei. Não era momento ainda de retornar para casa e encontrar com ela, depois de ter sido chamado pelas piores alcunhas jamais me atribuídas. Ela tinha raiva, eu tinha raiva, e não seria uma conversa numa madrugada fria que resolveria. Acabaríamos brigando mais ou, pior, trepando feito cachorros na rua, por instinto e odor.

Seu sexo não saía de minha imaginação, mesmo em momentos de raiva, mas não gostaria de fazer disso a solução de nossos problemas. Seu sexo ainda sacudia meu paladar depois de uma manhã tranqüila e prazerosa. À tarde, porém, tudo desandou, nós desandamos e saí de casa para ver mais uma derrota do Vasco no Maracanã. Assim fui parar na Praça da Bandeira e ignoro qual solução ela encontrou para curar a dor, se é que ela estivesse sentindo alguma. Só não queria que a solução mais uma vez fosse nosso sexo, por mais interessante que isso pudesse aparentar.

Na última vez que resolvemos uma de nossas brigas com sexo, há menos de duas semanas do dia em que traí minha mulher pela primeira vez, chorei sozinho no banheiro, abafando o som com uma toalha de rosto entre meus dentes. Havíamos trepado com raiva, mordendo, batendo e puxando os cabelos um do outro. E foi bom, muito bom, melhor do que as transas apaixonadas do início de nossa relação. E eu sofri por ter sido bom amá-la pela raiva. Quando voltei para o quarto, ela dormia um sono honesto e não parecia ter se importado com aquela forma de amor. Sofri ainda mais por sua indiferença.

Minha raiva naquele domingo não seria resolvida com Dudus e putas, mas alguma coisa precisava ser feita antes de voltar para casa, justamente para evitar um ato sexual como aquele, de duas semanas antes. Foi nesse contexto que conheci Camila num banco do segundo andar da rodoviária. E foi essa história, com os mesmos poucos mas importantes detalhes, que contei para ela.

Camila ouviu meu relato com aparente atenção e apenas perguntou se eu não queria tentar o sexo com ela. Parecia absurdo demais trair minha mulher com uma paraense conhecida na Rodoviária Novo Rio numa noite fria do cidade. Mas naquela noite eu precisava de Camila, até para descobrir se o sexo poderia existir com outra pessoa e se a TV poderia estar desligada. Porque minha mulher apenas topava transar com a TV ligada, qualquer que fosse a ocasião. Não tinha tara por filmes pornográficos, mas gostava de prestar atenção em novelas, séries e filmes de suspense enquanto transava. Ela me jurou que isso aconteceu em todos os seus namoros anteriores, mas eu não gostava de falar no assunto, além de temer que meu sexo pudesse ser enfadonho a ponto de ser necessário uma TV ligada. Father Oblivion não conseguiria tanto.

No hotel ao lado da rodoviária senti falta da TV num primeiro instante, antes de tocar no seios de Camila. Pensei nas etapas que era obrigado a cumprir com minha mulher e fui fazendo a mesma seqüência, por prática e instinto. Mas a TV fez falta e me toquei que seria um equívoco trepar daquela forma. Parei e chorei pela dor da minha traição e por me ver tão fraco em não conseguir manter uma relação com outra pessoa. Camila também chorou - por piedade, acredito. Enxugou minhas lágrimas, me disse que me faria feliz novamente e segurou meu pau com força e delicadeza.

. O sexo pecaminoso com a paraense não foi bom. Talvez os quinados, a longa caminhada ou a aflição pelo erro cometido tenham surtido algum efeito. Mas tive a revelação naquela madrugada que eu poderia, ainda que por força das circunstâncias, encontrar alguma felicidade fora de casa. Eu precisava ter essa certeza, antes de prosseguir minha vida conjugal.

Só voltei para ela no dia seguinte, incerto sobre o futuro. Ela me esperava chorando e não perguntou onde eu havia passado a noite. Mas eu contei, contei tudo. E perguntei tudo também, até mesmo sobre o motivo que a fazia deixar a televisão ligada enquanto transávamos. Exigi saber tudo. Ela chorou mais mas, surpreendida com tanto interesse, respondeu a todas as minhas perguntas. Sofri mais com as respostas do que ela com a traição e, tenho certeza, isso ficou claro. Nos sentimos vingados um do outro e decidimos continuar juntos. Não sei se foi uma boa decisão.