Toda Forma De Amor
Cena 3
O corpo ainda doía do trabalho de parto que consumira algumas horas. Lúcia havia gritado e sofrido para que a pequenina ali finalmente nascesse, e, então, tendo agora sua filha nos braços é como se ela tivesse acabado de nascer. Olhava aqueles olhos fechados e imaginava como um dia haveriam de ser, e também os membros tão gorditos ou a barriga cheia e aqueles ralos fios de cabelo. Que formas estariam se camuflando naquele corpo? Médicos e enfermeiras corriam dentro da sala de parto, alguns falavam com ela, perguntas e mais perguntas, nada daquilo devia realmente importar.
Por aquele breve instante do contato primeiro Lúcia quase desejou que Paulo Roberto, o pai daquela criança, estivesse ali para se alegrar pelo neném deles, mas foi só por aquele breve instante e não deixou de ser apenas um quase desejo. Apenas quase, como o pai que ele havia sido, um quase pai, assim como quase marido e quase amante. Paulo Roberto era apenas um fragmento de homem para ela, e sua filha havia de merecer alguém que o fosse por inteiro.
Como um sujeitinho daqueles, sujeitinho no diminutivo mesmo, havia sido capaz de dar a Lúcia alegria tão grande é um mistério que nada no mundo poderá decifrar. Corre a lenda de que Paulo Roberto era bonitão e dispunha daquela gaiatice típica nos homens pouco honestos, era um cara safo, poder-se-ia dizer. Lúcia bem lembra que na feitura da filha deles, Paulo Roberto balbuciou outro nome no gozo que não o dela, mas chamou por uma Carmem ou Carla ou algo assim. Dois meses depois, Paulo Roberto acordaria com a boca cheia de formiga por conta de dívidas no jogo do bicho. Era um sujeitinho, jamais iria entender aquela criança em seus braços.