quarta-feira, novembro 10, 2004

Delírios pornográficos juvenis

Quando adolescente, noite após noite eu sonhava com um súcubo invadindo meu quarto e estraçalhando minha crença cristã e minha virgindade. Era terrível e ao mesmo tempo confortante. E excitante, sem dúvida. Meu súcubo não tinha nome, talvez por meu medo de que aqueles sonhos pudessem ser uma sugestão demoníaca. Tinha medo de ser possuído mesmo.

Mas ele, o súcubo, tinha um corpo feminino fascinante, sempre nu e com uma cauda vermelha que arranhava minhas costas. Minha imaginação se esforçava, mas não lembro de um dia ter conseguido encostar em seu sexo. Apenas provocava, o demônio. Envergonho-me ainda hoje, mas foi mais ou menos naquela época que aprendi o significado de ejaculação noturna.

O efeito desses sonhos, porém, era muito pior do que pode parecer à primeira vista. Eu havia aprendido, não fazia muito tempo, que Lúcifer existia, sim, e que atuava entre os seres-humanos, instigando-os para se afastarem de Deus. E, lógico, eu havia acreditado. Desnecessário dizer que eu tremia de medo de encontrar um dos arautos do tinhoso por aí. Não temia exatamente a figura grotesca com rabo, tridente e chifres. As raízes de minha fé eram rasas demais e não seria preciso muito esforço para que eu sucumbisse a algumas tentações.

Nesta mesma época cogitei colocar um crucifixo pendurado no banheiro, para tentar evitar qualquer pecado solitário comum e penoso a jovens, adultos e padres realmente católicos. Desisti, possivelmente pela percepção que a masturbação não seria evitada e só aumentaria minha culpa.

Esse delírio, o do súcubo, veio à cabeça e parou no papel depois que recebi, de uma grande amiga estudante de história, um e-mail com casos da Idade Média: "dos judeus, dizia-se que eram agentes do Diabo, que tinham órgãos sexuais anormalmente grandes e que desejavam com concupiscência as donzelas cristãs". É incrível como a gente vai aprendendo coisas nessa vida. Se tivessem me contado isso na adolescência, acredito que teria, eu mesmo, arrancado meu prepúcio, aderido ao mundo da ilusão de ótica e me convertido ao judaísmo. Estou certo que ficaria lindo de quipá. Nunca fiz questão de um órgão sexual anormalmente grande, mas esse negócio de donzela sempre mexeu comigo.

Meus sonhos hereges, os com um súcubo, atormentaram minhas confissões durante um bom tempo. Eu simplesmente não tinha coragem para contar a meu confessor. Dom Tadeu, eu tenho mais um pecado. Eu tenho ereções, daquelas do tipo quase-voluntárias, ao imaginar um demônio do sexo feminino deitado em minha cama. Dom Tadeu, existe perdão para isso?

Alguns anos depois, lendo Hellblazer, um dos meus quadrinhos preferidos, fui induzido a me imaginar em cenas de sexo com a Virgem Maria. E, entendam, eu participava de uma congregação mariana, o que tornava tal pecado muito mais pecado mortal do que qualquer outro que eu pudera ter cometido anteriormente. Em fúria, por aqueles pensamentos sórdidos, rasguei dúzias de gibis com as histórias de John Constantine. E fiz com raiva e com tesoura. Segui o caminho mais simples e culpei os quadrinhos por meu pecado. Dali em diante, nunca mais sonhei com um súcubo, mas também nunca mais fui o mesmo católico de antes.

Já muitos anos depois, nem mais católico nem mais virgem, tive a impressão de conhecer um súcubo. Fui seduzido, mas novamente não encostei em seu sexo. Conversamos sobre minha crença na inexistência do amor. Acredite, súcubo, o amor, como o concebemos, não passa de comodidade e conveniência. Ele se excitou com aquele papo e pareceu concordar. André Miranda, você é meu tipo de homem e, juntos, andaremos em pândegas, provocaremos os puritanos e seremos felizes.

Tudo o que eu sempre busquei como católico foi a busca pela felicidade, sabem? A imagem juvenil do súcubo voltou, virei as costas e sumi sem dizer uma palavra. Eu não acredito mesmo nesse amor entre homens e mulheres, mas já acreditei no amor de Deus. E isso não é exatamente fácil de apagar.