O amor de cada um (XII)
A monogamia poderia acabar com a relação dos dois, ela sabia disso. Mesmo assim, Camila se manteve fiel por longos dez anos, entre namoro, noivado e casamento. Não tinham filhos, ainda, ela e Mauro. Combinaram que esperariam uma estabilidade financeira que teimava em não vir. Eram um casal agradável, sem conflitos aparentes. Todos os dias pela manhã discutiam o que iriam comer no jantar e, mais ainda, quem iria prepará-lo. Tudo em parceria.
O cotidiano, porém, foi minando o casal. Sua vida, a de Camila, era enfadonha e ela não conseguia esconder mais tamanha insatisfação. Até as coisas boas adquiriram um ar de monotonia, impedimento aos sonhos de felicidade eterna de Camila com o marido que ela escolheu.
Mamãe, Mauro me pediu em casamento. Eu vou me casar, mamãe, sua única filha vai se casar. E com a mesma idade, os mesmos 23 anos que a senhora tinha quando casou com meu pai, mamãe. Que alegria, que alegria. Seremos felizes, mamãe, seremos felizes e lhe daremos dúzias de netinhos.
Dez anos depois, talvez a falta de filhos e de felicidade foram responsáveis pela traição de Camila. O sexo entre eles, que deveria ser a única coisa inesperada, a única coisa em que o cotidiano pudesse ser rompido, o sexo era ruim. Variavam entre quatro, cinco ou no máximo seis posições, aquelas que uma década foi mostrando ser as mais agradáveis aos dois. Era pouco, muito pouco. Levar o sexo para fora do quarto, então, era uma raridade. Até mesmo nas espaças viagens, raramente permitidas devido a um apertado orçamento familiar, o sexo acontecia nos quartos de hotéis. Apenas.
Numa quinta à noite, então, Camila avisou que chegaria mais tarde do trabalho no dia seguinte. Um novo projeto na produtora vai tomar todo minha noite, amor, é melhor você não me esperar. Ela treinara a mentira por duas horas no caminho do trabalho para casa, olhando firme no espelho retrovisor do carro. Nos primeiros cinco minutos, derramou-se em lágrimas por preparar uma plano tão sórdido contra aquele com quem sonhara viver. Depois, lembrou da monotonia e culpou a monogamia. Assim, quando chegou a hora, ela se manteve firme e Mauro acreditou.
Saiu do trabalho, em Botafogo, às 22h, na tal sexta-feira. Foi para o Cervantes, em Copacabana, mais para fazer hora do que para comer sanduíches com fatias de abacaxi. Por precaução, comeu um de filé de frango com queijo. Às 23h30m ela entrou no banheiro do bar, não tão fétido como o de outros bares, mas nem por isso um primor de higiene. Ali mesmo retirou jeans, blusa branca, colete de couro bege e calcinha de algodão preta. Vestiu mini-saia marrom, colante preta, salto alto vermelho e óculos escuro com uma lente meio amarelada. Passou batom e se encheu de maquiagem. Pagou a conta com uma nota de dez reais, não pegou o troco e saiu do Cervantes sem calcinha, a Camila.
Menos de uma hora depois, Jaime, um funcionário público negro de 36 anos, desquitado desde os 29, encostou com seu Santana vinho, modelo novo, com insulfilme e ar-condicionado, ao lado de Camila. Combinaram preço, ela entrou e partiram dali direto para um motel que, de tão nervosa, ela, depois, nem conseguia lembrar se ficava mesmo em Copacabana.
E ela deu. Deu tudo, até o cu, tão precioso que nem o marido o havia comido. Dentro do carro, Jaime já havia pedido que Camila movimentasse seu pau, para que ele fosse se preparando. No motel, então, Jaime gemia alto, urrava. Fode, sua puta. E o cu de Camila sangrava, sangrava muito. Com tanto sangue até parece que você nunca foi enrabada, vagabunda. Jaime era um pouco inseguro, muito por sua cor, muito pela forma rude com que seu pai o tratava na juventude. Gostava, portanto, de se mostrar superior às profissionais cujo serviço ele usualmente contratava. Vai vagabunda, fode!
Camila também teve sua contrapartida. Jaime não tinha pudores com putas e chupou, beijou e lambeu Camila como seu marido, Mauro, jamais havia feito. Provavelmente, apesar de ela se recusar a admitir - por vergonha, com certeza -, aquela transa proporcionou os melhores orgasmos de sua vida. Quiçá, os únicos.
Sua relação com Mauro nunca mais foi a mesma. Ela brigou para abolir toda monotonia do casal. Chegou até a comprar espartilhos e chicote para se divertirem. Ficaram mais sete anos juntos e tiveram uma filha, Isabel, linda menina. Até que o professor universitário Mauro a trocou por uma aluna da classe Relações Sociais na Idade Média.
Camila nunca mais viu Jaime.