Wander & Júpiter - Música do Coração
Quando guitarra, baixo, bateria e vocais se plugam ao coração, a música leva você a outra dimensão. Vem daí a tal filosofia que brada a plenos pulmões que o rock pode salvar o mundo, através da dança, de um bom fraseado de guitarra e o nosso coração. Um pensamento quase imaturo, eu sei, inocente demais para se fazer valer na lógica mercantilista das gravadoras mas que nem por isso deixa de acontecer conosco. Aconteceu comigo ontem, durante a apresentação dos gaúchos Júpiter Maçã e Wander Wildner na Loud!, festa que se realiza no Cine Íris, em sua última edição no dia 29 de maio.
Júpiter entrou no palco primeiro e, apesar de não ser tão familiar assim a nossos olhos e ouvidos, conquistou logo o bom público presente com sua música notoriamente beatlemaníaca. Voltando a cantar em português, ele trouxe as canções do seu novo disco, Júpiter Maçã no. 4, ainda a ser lançado, para o público carioca. Ministrou suas novas composições como "A Marchinha Psicótica do Dr. Soup" e "Síndrome de Pânico" com outras mais antigas (como a clássica "Lugar do Caralho"). A pegada roqueira sessentista com doses de britpop lisérgico de Júpiter agradou bastante a todos (o Cine Íris estava cheio), colorindo o show de Júpiter com um clima de festa e aquecendo todos para a apresentação de Wander.
Wander Wildner, com a bola cheia desde o Curitiba Pop Festival quando dividiu o palco com Frank Jorge, já é quase figurinha carimbada nos palcos cariocas. Ainda bem. Para este escriba, Wander é provavelmente um dos melhores cantores de rock vivos sobre a Terra, dividindo espaço no palco com gente como Neil Young e David Bowie, portanto não vou me desculpar pelos exageros porque serão todos muito sinceros. Wander trouxe ao Rio sua turnê de lançamento de "Paraquedas do Coração", disco com a produção de Tom Capone e recheados de baladas sangrentas e certeiras. Versões para "Candy", de Iggy Pop, "I Believe In Miracles" (traduzida em "Eu Acredito Em Milagres"), dos eternos Ramones e até "Hippie-Punk-Rajneesh", dos Replicantes, outrora banda onde Wander era vocalista, compõem o novo disco junto com as belíssimas "Eu Não Consigo Ser Alegre O Tempo Inteiro", "Rodando El Mundo" e "A Última Canção", e puseram o pessoal no Cine Íris para pular, pogar e cantar. Wander abriu o show com a lindíssima "Mantra das Possibilidades" (dos versos "Meu desejo é estar contigo/Mas eu não consigo/Eu sempre fico em paz") e tocou ainda as clássicas "Quase Um Alcoólatra", "Eu Tenho Uma Camiseta Escrita Eu Te Amo" , "Bebendo Vinho" e "Empregada". Um show acima de qualquer dificuldade técnica, marcado com a cumplicidade do público com o artista, coisa de quem faz e escuta música com o coração aberto.
Vou deixar este último parágrafo então para uma menina chamada Cecília, que esteve perto de mim ontem durante os shows. Enquanto Júpiter cantava um blues que Dylan se esqueceu de compor (com direito a violão e gaita), guitarra, violão, baixo, bateria, teclado, gaita e vocais se plugaram ao meu coração enquanto abraçava Cecília, dançávamos juntos e eu fechava os olhos. Eu estava noutro plano. O rock e Cecília estavam salvando o mundo naquela noite. Que sorte a minha.