sexta-feira, fevereiro 14, 2003

O amor de cada um (II)

Chegaram em sua casa às 21:45, entraram e foram direto disputar o controle remoto.

Ela, Sabrina, 52 anos, queria assistir a Fitzcarraldo, um filminho interessante do alemão Werner Herzog, gravado na Amazônia, com belas atuações de Klaus Kinski e Milton Nascimento. Estava programado para passar num desses canais de tv a cabo, talvez Eurochannel, talvez Cinemax, não recordava bem.

Ela, Maria Júlia, 16 anos, queria acompanhar o Big Brother. Era terça-feira, dia de eliminação, e Maria Júlia estava curiosíssima para saber quem cairia fora da casa. Além disso, Adriana, uma carioca de 23 anos era sua amiga, dizia ela, e participava do programa. Elas haviam se conhecido numa colônia de férias, quando Maria Júlia tinha 12 anos. Adriana tinha 18 e era monitora. Se no dia do julgamento algum deus perguntar a Adriana sobre alguma lembrança de Maria Júlia, a resposta será negativa.

Sabrina e Maria Júlia conheceram-se há pouco mais de dois meses, quando começou o ano letivo. Maria Júlia estudava no colégio Cruzeiro desde sua 5ª série. Dizia gostar de lá. Estava agora no 2ª ano do ensino médio e Sabrina era sua professora de história. Com duas semanas de aula, Sabrina, a professora, perguntou à turma se alguém estava interessado em discutir na casa dela alguns filmes relacionados a fatos históricos. Quatro estudantes gostaram da idéia, mas só Maria Júlia apareceu. As duas assistiram a Em Nome da Rosa e a professora contou para a aluna um pouco da história da Igreja Católica - sempre em tom crítico. Ao fim da falação de Sabrina, Maria Júlia já estava apaixonada.

Na semana seguinte, Maria Júlia não resistiu a sessão de Gladiador e se declarou para sua professora. Sabrina primeiro achou graça. Ela estava um tanto velha pra receber uma declaração de amor de uma menina de 16 anos. Não tinha mais o corpo e beleza da adolescência. Seus dois filhos, ambos mais velhos do que Maria Júlia, provocaram efeitos irreversíveis em Sabrina. Celulite, peitos murchos e caídos e profundas olheiras. Ela usava aqueles óculos compridinhos, comuns em estudantes de cinema - era um charme, achava. Disse a professora à aluna:

- Maria Júlia, pare com isso que eu me encabulo.

Maria Júlia não parou. Disse que gostaria de se entregar para sua professora. Abriu os dois botões de sua saia listrada e a escorreu para baixo até os pés. A professora ficou sem ação, prendeu a respiração e o máximo que conseguiu foi gaguejar. Maria Júlia era magra, suas medidas eram adolescentes e modestas, mas sua pele era lisa, levemente corada de sol. Uma graça. A aluna continuou, um tanto desengonçada, e tirou sua blusa preta. Não usava sutiã, não precisava, seus seios eram pequenos. A professora não resistiu e as duas transaram ali mesmo no sofá. No vídeo, Russel Crowe confabulava com um negro dentro de uma prisão.

Desde então, dia 5 de março, as duas começaram a namorar. Os filhos de Sabrina faziam intercâmbio e não havia empecilhos para seus encontros com sua aluna. Maria Júlia foi a primeira mulher com quem sua professora tivera relações. Já a aluna tinha sido iniciada com 12 anos, numa colônia de férias, com uma tal Adriana, monitora, então com 18 anos. Alguns diretores da colônia até desconfiaram do caso e nos anos seguintes não convidaram mais Adriana para trabalhar lá. As duas jovens nunca mais se encontraram e Maria Júlia guardava na lembrança os óculos compridinhos que a estudante de cinema Adriana ostentava.

Sabrina sabia da história de sua namorada com Adriana e morria de ciúmes. Ela, mais velha, nunca deixaria que Maria Júlia assistisse ao Big Brother. A opção portanto foi Fitzcarraldo. Sabrina emocionou-se com a magistral interpretação do falecido José Lewgoy. Maria Júlia dormiu.